sexta-feira, 18 de junho de 2010

Privilégios de um Sofredor

Me privar de sofrer é um equívoco.

Ensinar meu filho que tudo acabará bem, que a vitória estará sempre garantida é o tipo de coisa a qual não me submeterei jamais.

Essa doutrina insana, uma mentira deslavada na qual acreditamos piamente, que nos ensinou a rejeitar os momentos de dificuldade e sofrimento, que nos faz olhar para os vales da vida com medo e nojo... essa imbecil ideia que se desenvolveu no decorrer dos anos é uma infeliz mentira que nós mesmos inventamos.

Se aceitamos andar pelo Caminho, não foi pelo bem estar que ele poderia nos trazer, afinal, é uma estrada estreita, apertada e difícil de percorrer. Ignorar o "no mundo tereis aflições" que Jesus nos ensinou é uma estupidez. E esquecer que até no Vale da Sombra e da Morte, o nosso Pastor caminha conosco é a prova mais palpável da nossa incredulidade constante.

Somos simples garotos bobos que acreditam em tudo aquilo que nos trará conforto e segurança. Mas o que vale mesmo é que, como diz a letra de uma canção dos Los Hermanos, "Quem quer sempre vitória perde a glória de chorar!" Não é na bonança que nascem os verdadeiros amigos, não é na riqueza que um amor sincero se destaca, e tampouco não é na vitória que se conquista a verdadeira honra - o refrigério só vem quando precisamos dele, o consolo só chega quando carecemos de sua presença e a paz só é notada quando se conhece o efeito que sua ausência projeta em nossos corações.

Se somos todos irmãos, família de Cristo, um só Corpo em Deus, é impossível viver uma vida inteira sem sofrimento, pois sempre haverá alguém ao nosso lado que necessitará que choremos com ele, que andemos mais uma milha ou que soframos com ele a sua perda.

Quando olho pro meu filho, vejo que tenho que ensiná-lo a doutrina do amor. É minha obrigação dizer a ele o que não me ensinaram nas escolas e igrejas. Vou dizer a ele que perder não é ser menor na vida, e que o que mais importa, antes mesmo de ser um vencedor, é ter dentro do peito a verdadeira essência do cristianismo: o amor.

quinta-feira, 17 de junho de 2010

UMA BAGUNÇA SÓ… NADA MAIS!


“O princípio único do inferno é este: eu sou meu!” (George MacDonald)

O tempo passa e sinto que me torno mais crítico. Tenho cada vez menos medo de questionar pressupostos ou repensar paradigmas. Decidi que não aceito mais o que me é dito sem alguma reflexão. Tornei-me um hermeneuta da suspeição, sobretudo nos assuntos da fé. E ainda que creia com todo meu coração na revelação da Palavra de Deus, sigo cada vez mais desconfiado do que dizem sobre ela ou do que dizem que ela diz. Ninguém é dono da Verdade. Ela, sim, nos possui, esquadrinha, chamando-nos a níveis mais profundos de conhecimento e intimidade.

Dentre as afirmações que decidi confrontar está a compreensão do inferno como uma organização política bem definida e hierarquicamente estruturada. Quase uma brigada militar, espécie de batalhão sobrenatural com código de conduta elaborado e relações de respeito às escalas de comando. Seria uma força alternativa, nos moldes dos exércitos celestiais, conquanto oposta a eles. O “lado escuro da força”, como nos filmes de guerras nas estrelas. Desta tese surgem várias outras, sobre batalha espiritual, demônios territoriais ou estratégias de exorcismo eficaz. E muitíssimos especialistas em cada uma.

Não posso admitir que o diabo seja um general talentoso e estrategista com um batalhão sob seu comando. Não acredito que os demônios são soldados disciplinados e obedientes movidos por uma causa comum. Não posso aceitar que o inferno seja uma organização, contrária ao Reino de Cristo e com expectativas de sucesso ou triunfo final. Não faz sentido. O céu não passou por um “racha”, do tipo que enfrentam igrejas ou partidos políticos, mas expulsou de seu meio os rebeldes, os usurpadores, os orgulhosos irreconciliáveis, condenando-os à distância eterna. Seu pecado não foi uma idéia alternativa ou discordância pontual, mas a insubmissão narcísica de quem não se rende a autoridade de quem quer que seja, ainda que a autoridade seja o próprio Deus.

O diabo não é um líder; é um rebelde. Os demônios não são um exército, mas espíritos inquebrantáveis sem qualquer abertura para o arrependimento. Eles não deixaram a esfera da glória para construir um espaço de oposição e confronto, mas foram expulsos e condenados ao andar errante e sem perspectiva de futuro. Não se submeteram a Deus; não se submeterão a ninguém. Sua natureza é rebelião, arrogância, mentira e desobediência. Quem seria bem-sucedido na formação de uma organização cujas bases fossem a revolta e a insubmissão? Quem comandaria um grupo de criaturas incapazes de qualquer gesto de cooperação? Estão por aí para matar, roubar e destruir. Não constroem, não doam e não fornecem vida a nada.

O diabo e os demônios são exemplos de uma existência totalmente desprovida de comunhão com Deus. São um sinal de alerta: devemos vigiar para que não caiamos em suas armadilhas e também cuidar para que não nos tornemos incapazes de nos quebrantar. Mostram qual é o resultado da insubmissão generalizada e da insensibilidade para o Espírito, que é quem nos conduz efetivamente a todo caminho de arrependimento. Sua ação no mundo não é organizada, articulada ou planejada, mas movida por impulsos, sentimentos de ódio e ímpeto destrutivo. Tornam semelhantes a eles todos quantos lhes dão ouvidos e seguem seus passos. Foi assim que caíram juntos: imitando uns aos outros e, todos, ao primeiro da fila. Quem não os conhece que os compre…